BOM DIA SAUDADE

adeus saudade! eu disse um dia

contemplando a tua fortaleza

carregava na alma uma certeza

certeza que há muito já não via

na boca um sorriso de alegria

na face nem um traço de tristeza

nos olhos um reflexo da beleza

beleza que somente em ti havia

de repente, não sei como explicar

um ruído surgiu de algum lugar

uma voz estrangulada, uma agonia

uma voz fugidia, quase morta

era a saudade por detrás da porta

me esperando prá dizer – bom dia!

edinaldo leite

AMAR,ESTRANHO AMOR

vai depressa buscar as tuas balas

por favor, não tragas balas de festim

para assasinar o amor que há em mim

é necessário muito mais que balas

é necessário a agressão das falas

o corte do sabre, o fogo do estopim

para assasinar um amor assim

é necessário muito mais que falas

vai depressa buscar a solidão

não te esqueças dessa tal desilusão

assim, talvez me faças mal

tráz contigo, teu ódio teu rancor

e aquela estranhíssima forma de amor

feita de faca e punhal.

edinaldo leite

SEGREDOS

não conte a ninguém nossos segredos

não diga a ninguém que já te amei

diga mesmo que te maltratei

não revele as carícias dos meus dedos

não segredes nem mesmo aos arvoredos

eu não sei se algum dia te contei

certa vez para eles segredei

e eles revelaram nossos medos

não conte nada ao travesseiro

ele é perverso,víl e bandoleiro

te envolve em calor e te faz dormir

e ao te ver assim adormecida

sairá na noite e dirá pra vida

que já te fiz sonhar, que já te fiz sorrir.

edinaldo leite

INCENDIÁRIA SETA

Canta.

Canta que ainda há tempo

Leva teu canto

Aos quatro cantos do planeta

Que a tua voz incendiária seta

Certeira e calma

Como a mão do esteta

Calcine tudo, inclusive a alma.

Canta,

Canta que ainda há tempo,

Nós estamos vivos.

Edinaldo leite.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

QUANDO PARTE O ASTRO REI



Eu vi a boca da noite

Escurecer de repente

Morder do sol um pedaço

Que morria no poente

Pra doze horas depois

Vomitá-lo no nascente.


edinaldo leite.


Imagem: Gilmar Leite

terça-feira, 2 de agosto de 2011

ANOS DE CHUMBO

...Um dia eles disseram

Para que não falássemos,

E nós calamos.

Noutro dia eles disseram

Para que não cantássemos,

Nem músicas, nem hinos,

E nós emudecemos.

Disseram também

Para não sairmos de casa,

E nós nos trancafiamos.

Disseram que nós não nos amássemos,

E nossos lábios secaram.

Foi então que eles disseram

Para que a lua não brilhasse.

Aí, a lua nasceu

Redonda e sanguinolenta

Por trás da capelinha do monte.

Só assim percebemos

Que a força deles não era tanta.

O sol nasceu novamente.

edinaldo leite.

sábado, 30 de julho de 2011

pelas cancelas do mundo

perambulei pela vida
como um cego no deserto
o meu caminho era incerto
procurando uma guarida
no meu peito uma ferida
surgiu com o passar dos anos
mudei rotas,desfiz planos
afundei as caravelas
bati mais de mil cancelas
na estrada dos desenganos.

edinaldo leite.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

CONTRA AS VISÕES DA SERPENTE

QUANDO PEDRA COM PEDRA EU BATI
FIZ O FOGO BROTAR NOS CARRASCAIS
ENFRENTEI OS INVERNOS GLACIAIS
FIZ A RODA,E PARA O MUNDO EU PARTI
DAS CAVERNAS PARA A LUZ EU EMERGI
VIM DA NOITE GALOPANDO A MADRUGADA
A PROCURA DA ETERNA ALVORADA
DE UM FUTURO QUE EU SEI QUE NÃO TEM FIM
ESTE MUNDO JÁ NÃO SERÁ ASSIM
QUANDO A PÁGINA DO SÉCULO FOR VIRADA.

O AMANHÃ SERÁ BEM MAIS RADIOSO
QUANDO O SOL BRILHARÁ ENTRE NEBLINAS
DISSIPANDO A FUMAÇA DAS CAMPINAS
SURGIRÁ UM VERDOR MAIS MAVIOSO
O MACHADO NÃO CANTARÁ RAIVOSO
SUA ETERNA CANÇÃO ARTICULADA
SUA LÂMINA SERÁ APOSENTADA
POBRES ÁRVORES REPOUSARÃO ENFIM
ESTE MUNDO JÁ NÃO SERÁ ASSIM
QUANDO A PÁGINA DO SÉCULO FOR VIRADA.

DITADURA JÁ NÃO SERÁ POSSÍVEL
SEJA ELA DE ESQUERDA OU DE DIREITA
UMA ORDEM MAIS HUMANA,MAIS PERFEITA
PARA UM HOMEM MAIS PERFEITO,MAIS SENSÍVEL
UM SISTEMA BEM MAIS COMPREENSÍVEL
SURGIRÁ DE UMA FORMA ILUMINADA
RUIRÁ ESSA IDEIA ULTRAPASSADA
QUE A TERRA NASCEU PARA TER FIM
ESTE MUNDO JÁ NÃO SERÁ ASSIM
QUANDO A PÁGINA DO SÉCULO FOR VIRADA.

SURGIRÃO,-A HISTÓRIA NUNCA MENTE
NOSTRADAMUS COM UM LIBELO MAIS PERFEITO
NOVA FORMA,NOVA ESSÊNCIA,NOVO JEITO
NOVOS HOMENS,PROFECIA DIFERENTE
NOSSA TERRA SERÁ EXATAMENTE
A UTOPIA QUE NÃO FOI REALIZADA
MAS UM DIA POR MORUS FOI SONHADA
E O SONHO DE UM HOMEM NÃO TEM FIM
ESTE MUNDO JÁ NÃO SERÁ ASSIM
QUANDO A PÁGINA DO SÉCULO FOR VIRADA.

CONTRA TUDO O QUE DIZEM ESSES SÁBIOS
SURGIRÁ NOVA AURORA,NOVO DIA
NOVA ORDEM PARA O MUNDO SE ANUNCIA
APOIADA NA VERDADE DE ALFARRÁBIOS
APESAR DESSE FOGO NOS TEUS LÁBIOS
TERÁS PAZ NUMA TERRA HUMANIZADA
ONDE OS MÍSSEIS DE UMA GUERRA PROPALADA
TROCARÃO AS OGIVAS POR JASMIM
ESTE MUNDO JÁ NÃO SERÁ ASSIM
QUANDO A PÁGINA DO SÉCULO FOR VIRADA.

edinaldo leite.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

NINGUÉM COMPRA A POESIA

OS VERSOS DE UM MANOEL XUDÚ
O REPINIQUE HIPNÓTICO DA VIOLA
SE APRENDE NA VIDA QUE É ESCOLA
PROVA DISSO FOI UM ZEZÉ LULU
UM CABOCLO AQUI DO PAJEÚ
QUE VIVIA FAZENDO CANTORIA
SEM INGRESSO,SEM CACHÊ E SEM BACIA
IMORTALIZOU-SE NOS ARQUIVOS DA PELEJA
COMO PODE CABER NUMA BANDEJA
O VALOR IMPAGÁVEL DA POESIA?

COMO PODEM QUERER COMPRAR O CÉU
E AS ESTRELAS QUE MORAM N'AMPLIDÃO?
NINGUÉM PAGA UNS VERSOS DE CANCÃO
NEM AS AGRURAS DA ALMA DE UM RÉU
NINGUÉM COMPRA UMA TORRE DE CHAPÉU
QUE SE FORMA NO NASCENTE TODO DIA
QUAL O PREÇO DOS MISTÉRIOS DE MARIA,
QUANTO VALE UMA BRISA BENFAZEJA?
COMO PODE CABER NUMA BANDEJA
O VALOR IMPAGÁVEL DA POESIA?

LOURIVAL QUE ERA O REI DO TROCADILHO
O LIRISMO DE UM ABSOLUTO
VELHO PINTO DO MONTEIRO BEM ASTUTO
NUMA RIMA JAMAIS PERDEU O TRILHO
AFOGUEAVA O REPENTE DANDO BRILHO
SEM JAMAIS TER USADO HIPOCRISIA
SUAVE COMO O VENTO EM MELODIA
OU RAIVOSO COMO O SOL QUANDO DARDEJA
COMO PODE CABER NUMA BANDEJA
O VALOR IMPAGÁVEL DA POESIA?

NÃO EXISTE MOEDA FABRICADA
SEJA ELA DE PRATA OU DE PAPEL
QUE AINDA POSSA DOMAR ESTE TROPEL
DE POEMAS QUANDO PARTEM EM DISPARADA
SÃO REFLEXOS DE UMA MENTE ILUMINADA
LIBERTÁRIOS CORRENDO A REVELIA
EU DUVIDO QUE APAREÇA QUALQUER DIA
QUEM TABELE ESTA MUSA SERTANEJA
COMO PODE CABER NUMA BANDEJA
O VALOR IMPAGÁVEL DA POESIA?

O PAGAMENTO QUE EU ACHO MAIS PERFEITO
É O POVO APLAUDINDO E DELIRANDO
A CABEÇA, DE VERSOS VAI INCHANDO
MEGATONS DE POEMA EXPLODEM O PEITO
SE DO MEIO DO POVO ALGUM SUJEITO
SE LEVANTA COM DINHEIRO EM GRITARIA
PARA MIM ACABOU-SE AQUELE DIA
APAGOU-SE A FORNALHA DA PELEJA
COMO PODE CABER NUMA BANDEJA
O VALOR IMPAGÁVEL DA POESIA?

edinaldo leite.

quarta-feira, 5 de agosto de 2015


Outro escritor que revelou admiração à obra do poeta paraibano foi Carlos Drumond de Andrade, comparando-o a Olavo Bilac e questionando a eleição deste, pela revista Fon-Fon, como príncipe dos poetas brasileiros:

“Em 1913, certamente mal informados, 39 escritores, num total de 173, elegeram por maioria relativa Olavo Bilac príncipe dos poetas brasileiros. Atribuo o resultado a má infomação porque o título, a ser concedido, só poderia caber a Leandro Gomes de Barros, nome desconhecido no Rio de Janeiro, local da eleição promovida pela revista Fon-Fon, mas vastamente popular no Nordeste do país, onde suas obras alcançaram divulgação jamais sonhada pelo autor de ‘Ouvi Estrelas’. E aqui desfaço a perplexidade que algum leitor não familiarizado com o assunto estará sentindo ao ver defrontados os nomes de Olavo Bilac e Leandro Gomes de Barros. Um é poeta erudito, produto da cultura urbana e burguesa média; o outro, planta sertaneja vicejando à margem do cangaço, da seca e da pobreza. Aquele tinha livros admirados nas rodas sociais, e os salões o recebiam com flores. Este, espalhava seus versos em folhetos de cordel, de papel ordinário, com xilogravuras toscas, vendidos nas feiras a um público de alpercatas ou pé no chão. A poesia parnasiana de Bilac, bela e suntuosa, correspondia a uma zona limitada de bem-estar social, bebia inspiração européia e, mesmo quando se debruçava sobre temas brasileiros, só era captada pela elite que comandava o sistema de poder político, econômico e mundano. A de Leandro, pobre de ritmos, isenta de lavores musicais, sem apoio livresco, era o que tocava milhares de brasileiros humildes, ainda mais simples que o poeta, e necessidade de ver convertida e sublimada em canto a mesquinharia da vida. Não foi príncipe de poetas do asfalto, mas foi, no julgamento do povo, rei da poesia do sertão, e do Brasil em estado puro”.